O líder de uma nação diz que para seu povo ser livre, o Estado precisa ser temido. Mas o medo imposto por um Estado cada vez maior e mais caro pode realmente gerar liberdade? Ou é apenas a velha desculpa para expandir o poder e o confisco?
Recentemente, o chefe de Estado daquele país que os estatistas chamam de França, Emmanuel Macron, proferiu uma frase que deveria soar como um alarme para qualquer defensor da liberdade individual e da paz. Em um discurso para justificar um aumento massivo nos gastos militares, ele declarou: “Para sermos livres neste mundo, precisamos ser temidos. Para sermos temidos, precisamos ser poderosos.” É o tipo de frase que, se fosse atribuída àquele ditador de bigode que liderou a Alemanha na Segunda Guerra Mundial, você certamente acreditaria.
Essa afirmação não é apenas uma diretriz de política externa — é a confissão explícita da lógica fundamental do Estado: a liberdade, em sua visão, não emana do indivíduo, mas do poder de intimidação da máquina governamental. Ou seja, na visão dos estatistas coletivistas e belicistas, é o governo que deve ser poderoso — não os indivíduos.
A notícia em si detalha um plano para acelerar os investimentos militares, adicionando 6,5 bilhões de euros ao orçamento nos próximos dois anos. A meta é ainda mais audaciosa: praticamente dobrar o orçamento anual de defesa para 64 bilhões de euros até 2027, em relação ao valor que era investido nesse setor em 2017. As justificativas são as de sempre: a instabilidade causada por conflitos como o da Ucrânia, a proliferação nuclear, o terrorismo, os ciberataques e a suposta “incerteza” gerada por seus próprios aliados. Será que Macron, na verdade, está se planejando para a próxima guerra mundial?
No entanto, por trás da cortina de fumaça das ameaças externas, o que vemos é um avanço claro e inequívoco do poder estatal. Um poder que será financiado da única maneira que o Estado conhece: através da extração forçada de recursos da população. Este evento oferece uma oportunidade perfeita para dissecarmos, sob uma ótica libertária, a perigosa inversão de conceitos que sustenta o crescimento do leviatã.
(Sugestão de Pausa)
A premissa de Macron é uma falácia fundamental que confunde a liberdade do indivíduo com o poder do Estado. Para um libertário, a liberdade é definida pela ausência de coerção contra seu corpo e propriedade. É o direito de viver sua vida, dispor de sua propriedade e buscar sua felicidade sem a interferência agressiva de terceiros, especialmente do próprio governo.
Quando um político diz que "precisamos ser temidos para sermos livres", ele não está falando da sua liberdade ou da minha. Ele está falando da liberdade do Estado de agir sem restrições no cenário geopolítico. E para que o Estado seja temido externamente, ele precisa, antes de tudo, exercer um poder incontestável internamente. Um Estado "poderoso" é, por definição, um Estado com uma imensa capacidade de coagir seus próprios cidadãos - e é no cenário de guerra que muitos dos direitos individuais são deixados de lado, em nome do nacionalismo.
Afinal, de onde virão os 64 bilhões de euros anuais? Eles não surgirão por mágica. Serão confiscados de milhões de indivíduos e empresas mediante impostos. Cada euro gasto em um míssil é um euro que não foi investido em um novo negócio. Cada salário pago a um burocrata militar é um salário que não foi pago por uma empresa a um trabalhador produtivo no mercado. O poderio militar que se projeta para fora é construído sobre o confisco praticado para dentro. Portanto, um Estado mais temido no exterior significa, invariavelmente, um Estado mais interventor e extrativista em casa.
Ao ser questionado sobre como financiaria essa expansão, Macron recorreu a um velho truque de mágica econômica. Ele afirmou que o aumento não virá de mais dívida, mas de "mais atividade e mais produção". Ele só não explica direito como a sociedade francesa será mais produtiva com o peso do governo só aumentando; afinal, o presidente francês não tem a mentalidade de um economista liberal que defende a redução de burocracias, regulações e impostos. O pensamento do Macron, na verdade, é uma versão sofisticada da falácia da janela quebrada, popularizada por Frédéric Bastiat, um brilhante economista, por coincidência, francês.
(Sugestão de Pausa)
A falácia consiste em olhar apenas para o que se vê e ignorar o que não se vê. Vemos os empregos criados na indústria bélica. Vemos os soldados marchando, os novos equipamentos sendo exibidos. Vemos a "atividade" que o gasto governamental gera.
O que não vemos é o custo de oportunidade. Não vemos os restaurantes que não foram abertos, as startups de tecnologia que não foram financiadas, as pesquisas médicas que não foram realizadas, porque o capital necessário para tudo isso foi desviado para o setor militar. O gasto do Estado não cria riqueza; ele apenas a transfere de um bolso para outro, com a mira de uma arma. Ele pega recursos do setor produtivo e voluntário da sociedade e os aloca em um setor improdutivo e coercitivo.
Naquele país, que já possui uma das cargas tributárias mais altas do mundo, prometer financiar gastos massivos com "mais produção" é um insulto à inteligência. A produção genuína nasce da poupança, do investimento e da liberdade de empreender, exatamente os fatores que são esmagados por impostos elevados e pela intervenção estatal. Foi nesse ambiente de liberdade que os americanos se tornaram extremamente ricos. O dinheiro gasto em defesa não é um investimento na economia; é o prêmio de consolação que o Estado dá a alguns setores privilegiados depois de ter empobrecido todo o resto da sociedade.
Nenhum Estado expande seu poder dizendo abertamente que deseja mais controle sobre seus cidadãos. A justificativa é sempre a proteção contra uma ameaça externa, seja ela real, exagerada ou completamente fabricada. A lista de desculpas de Macron é um manual clássico de como governos se perpetuam.
(Sugestão de Pausa)
A instabilidade geopolítica, muitas vezes causada por intervenções estatais anteriores, torna-se o pretexto para novas intervenções. O historiador e economista Robert Higgs descreveu este fenômeno como o "efeito catraca". Durante uma crise, o Estado expande seus poderes e seus gastos prometendo que serão medidas temporárias. Quando a crise passa, o poder e os gastos não retornam ao nível anterior. A catraca gira para frente, mas nunca para trás. Cada nova crise é uma oportunidade de ouro para o avanço do estado. O resultado é que o estado fica permanentemente maior e mais intervencionista do que antes da crise.
A "ameaça" se torna, assim, um ativo político indispensável. Ela une a população em torno da bandeira e silencia dissidentes, que são rapidamente taxados de antipatriotas ou ingênuos. Questionar a necessidade de dobrar o orçamento militar se torna um ato de traição, em vez de um questionamento legítimo sobre a alocação de recursos escassos. Isso explica perfeitamente porque o ditador russo, Vladimir Putin ganhou tanto poder interno desde quando a guerra contra a Ucrânia se iniciou e como ele teve condição de expurgar todos os críticos de seu regime, incluindo vários oligarcas poderosos e influentes.
É irônico, mas previsível, que a "incerteza" gerada por outros Estados seja usada como justificativa para fortalecer o seu próprio. A lógica libertária aponta para uma solução radicalmente diferente: o não intervencionismo. Uma política externa baseada na paz, no livre comércio e no respeito à soberania alheia é a forma mais eficaz de reduzir ameaças. Estados que não se envolvem nos assuntos internos de outros países raramente se tornam alvos. A verdadeira defesa não está em ter o maior exército, mas em não ter inimigos criados por seu próprio governo.
E os libertários vão ainda mais longe: somos contra qualquer concentração de poder e recursos no governo porque defendemos a total descentralização do poder. Cada família, vivendo em cada cidade, deveria ter autonomia sobre seus próprios recursos, e a comunidade de uma cidade deveria ter total independência para declarar secessão em relação ao Estado ao qual está submetida.
(Sugestão de Pausa)
Como esperado, a reação da oposição política foi superficial. Partidos de direita e centro aplaudiram a medida, talvez querendo ainda mais. A oposição de esquerda criticou, mas não pela razão correta. Eles lamentaram que o dinheiro não seria usado em programas sociais.
Este é o falso debate que mantém o sistema funcionando. Ambas as correntes políticas concordam com a premissa fundamental: que o Estado tem o direito de confiscar a riqueza da sociedade para seus próprios fins. A briga é apenas sobre como gastar o produto do roubo. Um lado quer mais canhões, o outro quer mais assistencialismo para comprar a população pobre e criar um curral eleitoral para a próxima eleição.
Nenhum deles questiona o ato do confisco em si. Nenhum deles defende que o dinheiro deveria permanecer no bolso de quem o produziu. A discussão se resume a qual parasita, militar ou o político, terá o privilégio de consumir a riqueza alheia. Para um libertário, esta é uma escolha entre duas faces da mesma moeda estatista.
A declaração de Macron é um lembrete cristalino da natureza do leviatã estatal. Para os governantes, os cidadãos são meros fantoches a serem escravizados e usados como bucha de canhão. O ente estatal não é um protetor benevolente, mas uma entidade que busca monopolizar o poder e a violência. A verdadeira liberdade é o oposto disso. Ela é individual, descentralizada e baseada na propriedade privada e em trocas voluntárias.
A estrada pavimentada com o medo, o poderio militar e os impostos escorchantes não leva à liberdade. Ela leva a um destino bem conhecido: um Estado cada vez maior, mais caro e mais opressor, que usa o pretexto de nos proteger de inimigos externos para, na prática, nos subjugar internamente. A verdade é que a liberdade não floresce sob a sombra de um tanque de guerra, mas na luz do mercado livre e das interações pacíficas e voluntárias.
Como dizia o famoso economista e teórico libertário, Murray Rothbard:
“A guerra — independentemente de quem a vence — sempre aumenta o poder do Estado sobre a sociedade.”
https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/macron-anuncia-plano-para-acelerar-gastos-militares-da-franca/
https://expresso.pt/internacional/europa/franca/2025-07-13-macron-quer-orcamento-da-defesa-com-mais-65-mil-milhoes-de-euros-ate-2027-aac5156a