Prepare-se, meu amigo: a gasolina que você coloca no seu carro vai ficar ainda mais batizada.
Poucos dias atrás, a Câmara dos Deputados votou e aprovou um projeto de lei que trata dos chamados “combustíveis do futuro”. Já podemos adiantar a história, dizendo que esse tal futuro é o do seu carro indo parar na oficina mecânica. A medida em questão foi aprovada com tranquilidade - até porque, segundo informações que rolam à boca miúda, em Brasília, o próprio Arthur Lira trabalhou para viabilizar a aprovação do projeto. Foram nada menos que 429 votos a favor, apenas 19 votos contrários, e 3 abstenções. Agora, o projeto de lei segue para votação no Senado Federal.
O grande ponto da lei aprovada na Câmara é mesmo o aumento do percentual de etanol na composição da gasolina, atualmente vendida no Brasil. Por aqui, a gasolina já é mais do que batizada. Até o momento - enquanto a lei não é aprovada no Senado, e sancionada pelo Lula - a gasolina deve conter, no mínimo, 18% de etanol em sua composição. Reforço que esse é o mínimo obrigatório: a mistura pode chegar a conter 27,5% de etanol, pelas regras atuais - sim, mais de ¼ da composição total. Porém, de acordo com o que está previsto nesse novo texto legal, a participação do etanol na composição da gasolina vai saltar para um mínimo de 22%, podendo chegar a inacreditáveis 35%!
Nem preciso dizer que isso é realmente muita coisa. A título de comparação: nos Estados Unidos, existem debates que objetivam aumentar o percentual de etanol na gasolina, elevando-o para 15%. Atualmente, a gasolina comercializada por lá contém apenas 10% de etanol. Esse, por sinal, é o mesmo percentual em vigor na maior parte da Europa - sendo que, até poucos anos atrás, o valor era de apenas 5%. Ou seja, para a gasolina brasileira ficar mais batizada, só se ela tivesse água do Rio Jordão na mistura. Pelo andar da carruagem, daqui a alguns anos, o brasileiro não vai mais comprar gasolina - e sim duas opções de etanol: puro ou “gasolinificado”.
Mas a coisa não para por aí: também o diesel vai sofrer modificações, caso essa lei entre mesmo em vigor. Atualmente, esse combustível já conta com 14% de biodiesel em sua composição. Pelo texto legal aprovado, esse valor vai aumentar em 1 ponto percentual ao ano, até chegar ao patamar de 20%, em 2030. Além da gasolina e do diesel, porém, o projeto de lei ainda impacta os combustíveis para a aviação e o mercado de gás natural, e também cria um marco legal, com vistas à estocagem de dióxido de carbono. Nada mais do que a velha e conhecida baboseira ambientalista, como você bem sabe.
Esse tipo de medida não é nenhuma novidade. O próprio Geraldo Alckmin, que além de vice decorativo do Lula, é também ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, já tinha cantado essa pedra, em agosto do ano passado. Logo na sequência, o governo do Molusco apresentou esse projeto ao Congresso Nacional, por meio de seu Ministério de Minas e Energia. O texto aprovado na Câmara, contudo, uniu outros projetos ao texto original, apresentado pelo governo petista.
É claro que, de forma geral, essa medida pode ser explicada pela forte pressão ambientalista que tem sido feita, em toda a sociedade. A chamada “pauta verde” é considerada como sendo de grande importância para o governo Lula. É que, supostamente, a maior presença do etanol na gasolina ajuda a reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Essa mudança também serviria para empurrar as pessoas para carros elétricos e híbridos, que passariam a ter um desempenho mais interessante, em comparação com carros movidos a gasolina batizada.
Só que, como qualquer ação estatal, não apenas os reais objetivos por trás dessa lei são questionáveis; também os resultados esperados estão longe daquilo que foi alardeado pelos políticos. É sempre assim que a coisa funciona: o governo promete benefícios para a população e para o meio ambiente, mas só quem se beneficia nessa história são os amigos do rei - e nós já vamos falar sobre isso. Para o povão, só resta mesmo a conta a ser paga.
Em primeiro lugar, já se sabe bem que uma maior quantidade de etanol na composição da gasolina prejudica - e muito - o motor dos automóveis. Aliás, foi justamente por isso que os carros flex foram criados - uma legítima criação tupiniquim, diga-se de passagem. De forma geral, o etanol tem um efeito muito mais corrosivo para motores movidos apenas à gasolina. Para esses automóveis, serão necessários mais reparos, e uma maior reposição de peças. Talvez, seus usuários tenham que trocar de carro, buscando uma alternativa que aguente uma gasolina tão batizada assim. Tudo isso, é claro, vai impactar muito mais o meio ambiente.
Em segundo lugar, é importante frisar - embora isso seja óbvio para muita gente - que essa maior presença do etanol na mistura da gasolina vai aumentar o consumo total por motorista. O etanol tem um poder energético consideravelmente inferior ao da gasolina. Portanto, uma maior presença do etanol na mistura fará com que o automóvel rode menos quilômetros a cada litro consumido. Obviamente, o preço da gasolina não vai ser reduzido por essa mistura - você está pensando o que, rapaz? Ou seja: os motoristas terão que consumir mais gasolina, e gastar mais dinheiro, para rodar o mesmo percurso. Será que isso está sendo levado em conta, na questão da redução da emissão de gases poluentes?
Precisamos, também, nos deter na questão dos preços. Supostamente, uma das ideias por trás desse projeto de lei é reduzir a dependência do Brasil do combustível importado. Afinal de contas, o Brasil é um grande produtor de cana-de-açúcar; menos gasolina na composição, e mais etanol, significa autossuficiência e, portanto, preços mais estáveis, certo? Bem, na verdade, não. Existem os conhecidos problemas de safra, que já aconteceram, de forma nada desprezível, no passado - em verdadeiros episódios de escassez. Se passarmos por um cenário semelhante, veremos o preço da gasolina com mais etanol disparar.
Mas, afinal de contas, será que essa gasolina mais batizada ajuda mesmo a preservar o meio ambiente? Temos, aí, outro argumento bastante questionável. Como dito, o etanol vem da cana-de-açúcar, que - obviedade das obviedades - precisa ser plantada. Atualmente, o cultivo da cana-de-açúcar ocupa mais de 8 milhões de hectares no Brasil - o equivalente a 13% de toda a área plantada em terras brasileiras. Se a demanda pelo etanol vai obrigatoriamente subir, então o cultivo de cana-de-açúcar precisa ser expandido. E isso só poderá ser feito mediante desmatamento, para dar espaço a novas áreas de cultivo. Em outras palavras: teremos menos captura de gás carbônico, uma vez que teremos menos florestas.
Contudo, a mais importante das objeções é realmente a questão libertária. Se a nova composição da gasolina, e também do diesel, é algo impositivo, então, por definição, essa medida é totalmente antiética - além de, é claro, ser absurdamente antieconômica. Como em qualquer outro setor da economia, o melhor a se fazer nesse caso, seria deixar o mercado agir de forma livre para que os prós e os contras fossem devidamente pensados. Teríamos, nesse cenário, o máximo de eficiência, com o mínimo de gasto de recursos naturais. E isso tudo, respeitando os limites da propriedade privada.
Podemos concluir, dessa forma, que essa nova lei não representa nenhum ganho para os brasileiros, nem para o meio ambiente. Mas, então, por que o mundo político se esforçou tanto para aprovar esse texto legal? É que nessa equação ainda falta um sujeito muito importante: o amigo do rei. Na verdade, os maiores beneficiados com toda essa história são os produtores rurais - especialmente aqueles ligados ao cultivo da cana-de-açúcar. Afinal de contas, não é de hoje que esse tipo de arbitrariedade é imposta goela abaixo do povo brasileiro. A nossa gasolina é batizada já faz bastante tempo.
Pense que, por exemplo, o atual presidente da Copersucar, uma das grandes produtoras de cana-de-açúcar no Brasil, faz parte do “Conselhão” do governo Lula. Pois é. Na verdade, acredita-se que essa empresa possa estar envolvida num esquema ilícito com a BR Distribuidora, durante governos petistas anteriores - segundo delação feita por Nestor Cerveró. Sim, meu amigo, esse é o tamanho do buraco em que o povo brasileiro vai se enfiar com essa história de gasolina ainda mais batizada.
A verdade é que o lobby feito por grupos econômicos organizados é algo que, na prática, é indissociável do funcionamento da máquina estatal. A maior parte das leis, aprovadas nas diversas instâncias do Poder Legislativo, estão ligadas, diretamente, a interesses privados - e isso não apenas aqui, no Brasil. Acontece que esses grupos organizados têm um acesso fácil ao mundo político - principalmente por possuírem uma grande quantidade de dinheiro à disposição, para umedecer a mão de legisladores de todos os espectros políticos. A partir daí, é fácil fazer a mágica acontecer: num giro de cartola, eu e você pagaremos a conta de mais um benefício dado pelo estado, às nossas custas, aos empresários bem relacionados.
Torcer para que esse projeto não vingue no Senado é praticamente inútil; como já foi referido neste vídeo, a tramitação dessa lei já está muito bem azeitada no Congresso Nacional. Mais uma vez, o lobby venceu; e seu carro vai para a oficina mais cedo, para que o mega produtor de cana-de-açúcar ganhe ainda mais dinheiro. Esqueça aquela balela de preservação do meio ambiente; o que os políticos querem preservar é, apenas, a sua sagrada propina. De fato, poucas coisas são capazes de descrever tão perfeitamente o funcionamento do estado: uma máquina que existe, apenas, para beneficiar alguns, em prejuízo de todos os demais.
https://www.camara.leg.br/noticias/1043361-CAMARA-APROVA-PROJETO-DOS-COMBUSTIVEIS-DO-FUTURO
https://autoesporte.globo.com/servicos/noticia/2023/05/gasolina-com-30percent-de-etanol-pode-afetar-motores-que-nao-sejam-flex.ghtml
https://www.udop.com.br/noticia/2021/08/26/reino-unido-segue-o-brasil-e-dobra-percentual-de-etanol-na-gasolina.html
https://www.poder360.com.br/congresso/apos-articulacao-de-lira-camara-aprova-combustivel-do-futuro/
https://epocanegocios.globo.com/Brasil/noticia/2016/06/epoca-negocios-cervero-aponta-rossetto-em-tentativa-de-beneficiar-copersucar-na-br-distribuidora.html