Os fins justificam os meios?
A Ordem dos Assassinos, foi uma sociedade secreta islâmica que surgiu durante a Idade Média, especificamente no século XI. Eles eram conhecidos por realizar assassinatos políticos e estratégicos como uma forma de alcançar objetivos específicos. O termo "Assassino" é derivado da palavra árabe "hashashin", que se refere a "usuários de haxixe". A origem da associação do termo e os membros dessa ordem é um tanto incerta, mas há várias teorias a respeito, sendo a utilização dessa substância psicoativa a mais aceita. Independentemente, contudo, da origem exata da conexão entre a ordem e o termo "hashashin", a palavra passou a ser usada para se referir aos membros e essa associação persistiu ao longo do tempo. Ela também contribuiu para a construção da imagem misteriosa e temível dos Assassinos na história e na cultura popular.
Reza a lenda, o seu líder Hassan-i Sabbah (Haçane Saba), usava a estratégia do paraíso artificial para recrutar seguidores. Ele levava os candidatos a um jardim luxuriante, onde eram oferecidos prazeres sensoriais, incluindo haxixe, bebidas e mulheres, proporcionando uma experiência que os fazia acreditar que haviam sido transportados para o paraíso, dopando eles e dando-lhes missões, por vezes suicidas.
A Ordem dos Assassinos, num contexto do mundo islâmico, onde diferentes facções políticas e religiosas disputavam o controle, tinha como objetivo principal a promoção de uma forma específica de poder político e religioso na região, visando o estabelecimento de um estado xiita governado pela visão do Islã ismaelita, uma seita do xiismo.
A Ordem ganhou notoriedade durante as Cruzadas, quando assassinatos notáveis foram cometidos por seus membros. A fama dos Assassinos também cresceu devido às táticas astutas que empregavam, como a infiltração em grupos rivais e o uso do assassinato em público como meio de imputir medo e terror.
A relação entre a Ordem dos Assassinos e o jogo de videogame "Assassin's Creed" é, em grande parte, fictícia, embora o jogo tenha se inspirado nos conceitos e no ambiente dessa sociedade secreta. O jogo incorpora elementos históricos e arquitetônicos reais em seu enredo, misturados com uma narrativa ficcional que inclui tecnologias avançadas e viagens no tempo. Ao explorar cidades como Jerusalém e Damasco durante as Cruzadas, os jogadores interagem com eventos e personagens históricos, enquanto simultaneamente participam de uma trama fictícia que envolve os Assassinos. Embora a obra tenha tomado liberdades criativas ao reinterpretar a história e os eventos relacionados aos Assassinos, o jogo popularizou a Ordem em um contexto de entretenimento, introduzindo aos jogadores aspectos da história medieval islâmica.
O enredo central de "Assassin's Creed" envolve uma batalha milenar entre os Assassinos e os Templários, duas facções opostas que lutam pelo controle de artefatos antigos e influenciam o destino da humanidade. Os Assassinos buscam a liberdade e o livre arbítrio e os Templários buscam controle e ordem.
O objetivo dos Templários é a Nova Ordem Mundial. Eles acreditam que devem liderar e iluminar a humanidade para eventualmente transformar o mundo em uma utopia autossuficiente progressiva, supervisionada por eles e com a natureza barbárica humana erradicada. Os Templários veem isso como a solução definitiva aos problemas do mundo e da humanidade.
Tendo em vista a sua antipatia ao autoritarismo, os Assassinos (por sua vez) têm historicamente lutado sob a ideia de libertação para povos oprimidos. Contudo, não se deve confundir o objetivo deles com liberdade descontrolada e caótica, pois o núcleo de suas ambições é a paz, próspera e harmoniosa. Um mundo onde as pessoas se respeitam e possuem o livre-arbítrio para pensar da forma que desejarem. Nesse aspecto, eles compartilham com os Templários um desejo sincero de eliminar o caos que assola a humanidade. As visões opostas dos dois grupos sobre como completar esse objetivo, entretanto, esmagam essa similaridade. Como alternativa, eles propõem que a humanidade deva passar pela longa e árdua jornada do desenvolvimento de tolerância para todas as diferenças, um processo ridicularizado como ingênuo e impossível pelos Templários. Na visão dos Assassinos, a paz é um produto da educação, não da força, e possibilitada apenas com o fim do controle da informação e da sociedade que autocratas defendem...
A análise das diferenças fundamentais entre esses grupos antagônicos descritos na narrativa da obra sugere que a dicotomia da interpretação da moral, encontra-se enraizada justamente no método. Se a busca por um mundo melhor é justificada pela expropriação das liberdades individuais, ou se a violação qualquer do mínimo ético individual jamais justificaria quaisquer intentos, por mais bem intencionado que seja.
A filósofa britânica Philippa Foot, conhecida por suas obras no ramo da ética, idealizou um experimento mental que posteriormente ficou conhecido como O dilema do bonde. Trata-se de um cenário ético frequentemente discutido na filosofia moral, concebido para explorar dilemas complexos.
Nessa situação hipotética, um bonde está desgovernado em uma linha férrea e está prestes a atingir cinco pessoas amarradas aos trilhos à frente. A pessoa no controle do interruptor pode direcionar o bonde para outra via, salvando as cinco pessoas, mas, infelizmente, há uma pessoa amarrada a essa segunda via. O dilema ético central questiona se a pessoa deve ou não agir para direcionar o bonde para a segunda via, sacrificando uma vida para salvar cinco, ou optar por não interferir e permitir que o bonde siga seu curso inicial, causando a morte de cinco pessoas. O experimento do bonde é frequentemente adaptado com variações que incluem diferentes elementos, como a proximidade das pessoas nas vias, a relação entre a pessoa tomando a decisão e as vítimas, ou a possibilidade de intervenções alternativas. O objetivo é explorar como as pessoas aplicam princípios éticos, como utilitarismo, deontologia, ou outras abordagens, ao enfrentar decisões morais difíceis.
Não há resposta correta para tal dilema, mas há duas correntes de pensamento que se destacam; Duas visões diametralmente opostas.
Na primeira, a ideia de moral em Immanuel Kant, que é centralizada em seu sistema ético conhecido como "ética deontológica" ou "ética do dever". Para Kant, a moralidade é baseada na razão e na obrigação moral, em vez de consequências ou sentimentos. Neste prisma, a ação é boa ou má em si mesma. A ideia de sacrificar indivíduos para um bem maior entraria em conflito com a dignidade e o valor intrínseco de cada ser humano, que são princípios fundamentais em sua ética. Assim, Kant provavelmente rejeitaria a ideia de tomar uma ação que envolva o sacrifício de uma pessoa como sendo moralmente aceitável, mesmo diante do dilema do bonde. Ele enfatizaria que as ações devem ser guiadas pelo dever moral e pela consideração dos princípios éticos universais, em vez de serem determinadas pelas consequências específicas de uma situação.
O princípio da utilidade que foi desenvolvido pelo economista, jurista e filosofo inglês, Jeremy Bentham, ficou amplamente conhecido pelo aprofundamento teórico dado por John Stuart Mill, através da teoria ética desenvolvida em sua obra mais influente: "Utilitarismo", publicada em 1861. O utilitarismo busca determinar a moralidade de uma ação com base na maximização da felicidade ou do prazer e na minimização do sofrimento.
Mill define a moralidade pelo princípio da utilidade, que sustenta que as ações são moralmente corretas na medida em que promovem a felicidade geral. A felicidade, para Mill, é entendida como a busca do prazer e a ausência de dor. Embora o utilitarismo busque maximizar a felicidade geral, Mill reconhece a importância dos direitos individuais e da liberdade. Ele argumenta que a liberdade individual é fundamental para o desenvolvimento de faculdades superiores e, portanto, contribui para a felicidade geral, contudo, critica as teorias éticas deontológicas, como a de Immanuel Kant, que se baseiam em deveres e obrigações intrínsecas. Ele defende que a moralidade deve ser avaliada pelas consequências das ações em relação à felicidade geral, em vez de aderir a princípios fixos.
Embora o utilitarismo de Mill tenha sido uma contribuição significativa para a ética, ele também enfrentou críticas, incluindo preocupações sobre a avaliação subjetiva da felicidade, o desafio de mensurar diferentes qualidades de prazer e a possibilidade de sacrificar os direitos individuais em nome da maioria. Se a morte de uma pessoa levasse a salvar várias outras vidas, e o total de felicidade resultante fosse maior do que o sofrimento causado pela morte da primeira pessoa, o arcabouço teórico do utilitarismo consideraria essa ação como moralmente aceitável.
Agora trazemos à mente, todas as atrocidades que foram perpetradas desde a formação das primeiras civilizações. Quantos governos tirânicos, quantas mortes, quanta violência e quanta dor foram causas a seres humanos sob a justificativa de um bem maior para a maioria?
Segregação para promover a justiça social reparadora;
Perseguição de opositores para defender a democracia;
Censura para evitar o discurso de ódio;
Desarmamento para o bem de todos;
A grande problemática não está no utilitarismo em si mesmo, mas reside na sua utilização por indivíduos pretenciosos ou mal intencionados, que levantam bandeiras em que não acreditam, verdadeiramente, unicamente com o propósito de atender os seus interesses escusos. Só é possível evitar a possibilidade de que o poder concentrado em um grupo menor dê origem ao abuso de poder, através da liberdade e da capacidade de tutelar sua própria segurança.
Assassin’s Creed nos ensina a reconhecer que, através da liberdade, o caminho para o progresso será tortuoso e doloroso, mas também o pontapé para a aceitação do próprio protagonismo diante da vida e da história, ao passo que essa aceitação também representa a negação em entregar este protagonismo nas mãos de quem quer que seja, indivíduos supostamente iluminados que supostamente entendem exatamente do que a humanidade precisa para se elevar. No final das contas tudo é sobre ser capaz de ter força para sustentar as consequências da própria liberdade.
https://pt.m.wikipedia.org/wiki/Immanuel_Kant